domingo, março 13, 2011

para que serve o curador de artes visuais*

* texto publicado no jornal O Norte, em 15 de julho de 2007

Segundo o Dicionário Aurélio, curador é aquele que tem, por incumbência legal ou judicial, a função de zelar pelos bens e pelos interesses dos que por si não o possam fazer. Claro, estamos falando numa seara do Direito. A origem epistemológica da palavra curador vem do latim (curatore), que significa tutor, “aquele que tem uma administração a seu cuidado”. Nas artes visuais, o curador é aquele que “zela por uma coleção ou a concebe, organiza e supervisiona a montagem de uma exposição”.

Na verdade, o termo ‘curadoria’ é recente na área das artes visuais. No Brasil, ganhou contornos conceitual e prático no início dos anos 1980, com Walter Zanini à frente da Bienal Internacional de São Paulo. Na época, no papel de diretor artístico da Fundação Bienal, Zanini organizou a 16ª edição do evento, com trabalhos agrupados por analogia de linguagem, e não mais por pavilhões nacionais, como era prática até então. “A seleção das obras passou a obedecer, portanto, critérios relacionados à concepção e significação dos trabalhos, não mais ao espaço territorial ou temporal da criação”, como está dito no portal do Museu de Arte Moderna de São Paulo.

Daí, em alguns museus, passou-se a discutir a substituição do diretor técnico por um curador-chefe, com o objetivo de deixar todo o setor técnico-científico sob a responsabilidade de uma única figura profissional, contemplando atribuições como, entre outras, de “aconselhamento e sugestões para a seleção de obras a serem adquiridas ou doadas ao acervo do museu” e “aconselhamento e sugestões de exposições e outros projetos culturais a serem apresentados”, além de prestar “auxílio” na captação de exposições, mostras e obras de arte.

O desafio de realizar uma curadoria é expor e fomentar a discussão sobre a produção artística e desenvolver atividades práticas, necessárias à experimentação dos conteúdos conceituais da arte por meio de procedimentos que não têm a intenção de se tornar produtos artísticos, mas propor uma prática poética nas diferentes linguagens artísticas. A leitura da obra de arte pode ser aprendida e requer uma disposição aberta para entender os significados mais sutis, a linguagem das cores, das formas, das linhas, até chegarmos ao seu conteúdo. É aí que entra o papel educativo do curador que, com seu trabalho, busca aproximar o público dos conceitos que permeiam a arte.

O curador também é o responsável pela escolha das exposições, pela pesquisa e seleção de obras e artistas. E, junto com a equipe técnica, discute o planejamento museográfico (a organização espacial da sala e a localização das obras) e a montagem. Para cada exposição, os curadores desenvolvem pesquisas e conversas com os artistas e a equipe do setor ‘educativo’, trabalhando possíveis desdobramentos que contemplem os conceitos abordados. A partir destas pesquisas são criados temas norteadores (recortes temáticos que permeiam o percurso pelo espaço expositivo e relacionam as obras a outras áreas do conhecimento e acontecimentos do mundo), possibilitando uma melhor aproximação e compreensão do público com a exposição.

Da mesma forma que para alguém ler um texto requer que seja alfabetizado e saiba o significado das palavras, a apreciação de uma obra de arte precisa de um outro tipo de alfabetização: a da linguagem visual. Para compreender o significado de uma obra de arte, temos que ir além do aparentemente observado. Estamos compreendendo o seu conteúdo, a sua força, a sua magia, e esta compreensão faz com que possamos entender melhor nosso mundo e a nós mesmos. Às vezes visitamos um museu e nos deparamos com uma obra de arte de difícil entendimento. Muita gente chega a pensar que aquilo foi feito aleatoriamente, enquanto outras pessoas se aproximam e fazem alguns elogios, e aí ficamos num dilema: ou somos analfabetos no mundo das artes, ou aquelas pessoas são tão malucas quanto a obra que estão vendo.

Por outro lado, a necessidade de um curador nos dias de hoje, tão importante como já foi o marchand para os artistas impressionistas da Paris do século XIX, é a medida exata para se fugir de uma amostragem aleatória ou apoteótica, que, muitas vezes, só faz juntar obras de arte para ocupar um determinado espaço. Não confundir com a “Grande Tela”, o imenso corredor com pinturas de vários artistas – e de nacionalidades diferentes – na 18ª Bienal de São Paulo, proposta da curadora Sheila Lerner. Na verdade, havia uma intenção, um propósito: a coerência desta atitude com os percursos da pintura naquele momento em que se discutia a sua ‘morte’.

Noutro aspecto e com o objetivo de valorizar e qualificar ainda mais a produção artesanal, o Governo da Paraíba instituiu a Curadoria do Artesanato, ligada à Secretaria de Educação e Cultura, que passou a realizar o cadastramento de artesãos e sua produção, como também a realização das ‘provas de feitura’, classificando o artesanato por matéria-prima, técnicas principais e habilidades manuais para identificação da especialidade do artesão, e, por fim, emitir a Carteira de Habilitação do Artesão. Aqui, o papel da curadoria é tentar organizar a produção artística e ao mesmo tempo orientar destes produtores - os artesãos - na participação de eventos e sua inserção no mercado de forma responsável.

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