sexta-feira, junho 24, 2011

tarda, mas não falha!

No final de maio foi anunciada a prisão do general servo-bósnio, Ratko Mladic, o último dos três homens acusados de liderar uma limpeza étnica durante a guerra de 1992-95 na Bósnia. Mladic, foragido há 15 anos, será julgado em Haia por acusações de orquestrar o cerco brutal de 43 meses à capital bósnia Sarajevo e pelo massacre de 8 mil homens e meninos muçulmanos na cidade de Srebrenica, em julho de 1995. Já o Tribunal Penal Internacional para Ruanda condenou à prisão perpétua, neste mês de junho, em Arusha, na Tanzânia, a ex-ministra, Pauline Nyiramasuhuko. Pauline era uma dos principais réus de um grupo de seis pessoas acusadas de crime de genocídio e crimes contra a humanidade durante o massacre de tutsis em Butare (sul de Ruanda), e se tornou a primeira mulher condenada por genocídio pela jurisdição internacional.

O que agora ocorre com Ratko Mladic e Pauline Nyiramasuhuko também vem acontecendo, desde o Holocausto, com tantos outros ditadores, militares e dirigentes políticos que engendraram genocídios e outros crimes contra a humanidade. Ou seja, a justiça tarda, mas não falha. E agora, diante do levante popular no norte da África e no Oriente Médio também podemos esperar, em breve, julgamentos dos ditadores de países como Tunísia, Líbia, Egito, Síria, Iêmem, Bahrein etc.

Aqui no Brasil se diz que temos pouca memória, que logo esquecemos o mal que alguns dirigentes e políticos fizeram (e fazem) ao povo. São características de nossa formação cultural. Somos passivos demais. Temos amnésia para com os déspotas, embora, vez ou outra, haja surtos em tentar fazer justiça e/ou refletir sobre as cicatrizes do passado. Hoje estamos mais atentos.

No entanto, até parece que alguns administradores nunca imaginam que, um dia, serão julgados por seus atos, bons ou não. As pesquisas acadêmicas, hoje em bem maior número, e mesmo quando estão debruçadas sobre questões atuais, sempre partem de exemplos, ações e movimentos do passado. Ora, os fatos antigos sempre vem à tona e servem como instrumento para analisar a história e/ou julgar os bons e os maus.

Exemplo recente é o do ex-reitor da UFPB, Lynaldo Cavalcanti, que hoje é aclamado como aquele que, nos últimos 40 anos, fez a gestão mais progressista jamais vista em uma universidade nordestina. Mesmo ainda não devidamente reconhecido por toda sociedade, o professor Lynaldo instituiu na UFPB um tipo de gestão – especialmente, investindo nos cursos tecnológicos e nas ações de extensão – que atesta sua visão futurista. E atentem que ele dirigiu a universidade em plena ditadura militar...

Atualmente, na Paraíba, é notória a falta de responsabilidade dos nossos governantes quanto à aplicação de uma política cultural que responda, satisfatoriamente, ao desejo de tratar cultura como política de estado. Por desconhecerem o assunto, os governantes (a maioria jamais “frequentou” teatros, cinemas ou museus e são incapazes de trocar meia dúzia de palavras sobre o assunto) nomeiam pessoas sem nenhuma qualificação para dirigir órgãos culturais. Tudo gira em torno de mero arranjo político ou “de comadres”. E, por conseguinte, estas pessoas nomeiam outras que também não são qualificadas para os cargos. Resultado: um chefe despreparado e uma equipe desqualificada. E assim temos um monte de equívocos sendo tratados como “política cultural”. Vejam o primeiro parágrafo da introdução do documento Sistema Nacional de Cultura-SNC (MinC, 2011): “...As políticas para a cultura ainda ocupam posição periférica na agenda da maioria dos governos, além de serem conduzidas de forma pouco profissional. Parte desse problema está na indefinição a respeito do papel do poder público (Estado) na vida cultural.”

Ora, realizar encontros com as várias categorias artísticas e em todas as regiões do Estado é uma redundância desnecessária, talvez, mera ação politiqueira e demagógica. Afinal, desde o primeiro governo Lula, o Ministério da Cultura (além de estados e municípios) já promoveu inúmeros diagnósticos com maciça participação da sociedade civil, em todos os rincões do país. Alguns destes documentos – resultado das I e II Conferência Nacional de Cultura, ocorridas em 2005 e 2010 –, há muito estão disponibilizados no portal do MinC (www.cultura.gov.br), para que municípios e estados os tomem como referência na construção de suas políticas públicas. Há, inclusive, um Guia de Orientações para os Municípios – Perguntas e respostas, produzido pelo MinC em maio último.

O atraso na área cultural e a desmontagem dos órgãos oficiais provocados por dirigentes irresponsáveis serão, inexoravelmente, algum dia, relatados por pesquisas acadêmicas e estatísticas, e também amplamente divulgados. Foi assim quando o ex-presidente Collor desmobilizou órgãos vitais como a Funarte e a Embrafilme, por exemplo, provocando estagnação e atraso no setor cultural. Somente anos depois, já na primeira gestão do governo Lula, é que a cultura retomou sua importância, sua recuperação e é, atualmente, de fato, um projeto “federal”, que abarca todas as regiões, etnias, minorias e áreas artísticas. Hoje, todo o setor cultural do país tem a exata dimensão da destruição provocada pelo ex-caçador de marajás (isso até virou piada). Também, deve-se levar em consideração a força e importância, nos dias de hoje, das redes sociais que agem seja na mobilização popular ou na divulgação de denúncias, desmandos e outros crimes. Vejam o exemplo do que vem ocorrendo na Tunísia, Egito, Líbia, Iêmen, Bahrein, China, Coréia do Norte, Argélia, Marrocos...

Claro que as comparações – crimes contra a humanidade e má gestão pública – acima citadas até podem ter certo exagero, mas, creiam, é impossível mensurar os males provocados por ambos os crimes. Portanto, preparem-se senhores dirigentes e políticos: a história não falhará. Até por que, na época da barbárie da Segunda Guerra, ninguém também imaginaria que os monstros nazistas fossem, um dia, julgados e condenados por seus atos...