sexta-feira, novembro 30, 2007

arte pública mais uma vez

“A falta de referenciais de arte pública pode, no futuro, nos herdar lugares anônimos, frios, sombrios. Em algumas praças já se poderiam instalar esculturas de artistas contemporâneos para dialogar com árvores, bancos, pássaros, jardins e pessoas comuns”. Esse era o parágrafo final de um artigo já publicado aqui nesta coluna e que abordava arte pública. Coincidência ou não, na época se discutia o destino da escultura “Porteiro do Inferno”, de Jackson Ribeiro, além de algumas idéias surgidas nas reuniões da Comissão dos 420 Anos de João Pessoa (Paraíba não soa melhor?), que sugeria a instalação de obras de arte em ambientes públicos, praças, avenidas, edifícios, e fachadas.

Embora, muito antes, numa das reuniões de campanha do então candidato Ricardo Coutinho, alguns artistas presentes, já se falava sobre a Bienal de Esculturas ao Ar Livre da cidade de Resistência, localizada na região do Chaco, na Argentina, notícia trazida pelo artista Raul Córdula, que lá participou como membro do Júri de Premiação. Segundo o projeto inicial desta tradicional Bienal de Resistência, cinco ou seis escultores de várias partes do mundo são convidados para executarem em praça pública suas obras que, no prazo de dez dias e após grande integração com uma platéia de turistas e da comunidade local, concorrem ao grande prêmio de 30 mil dólares. Na verdade, cada artista recebe um pro labore “simbólico” e todas as condições de execução das obras, incluindo passagens, hospedagem e o material a ser utilizado. Como todos almejam o grande prêmio, aceitam todas as condições deste concurso que já entrou para a programação internacional de arte da Unesco. Ao final, as esculturas são incorporadas pela Prefeitura que escolhe em qual praça ou edifício público vão ser assentadas, ou ainda melhor, pelo preço real de uma escultura a cidade de Resistência adquire cinco ou seis peças, isso sem falar no ganho social, econômico e cultural. Vamos pensar juntos: Quantas obras de arte pública devem compor, hoje, o patrimônio desta cidade argentina? Quantos turistas não se deslocam para lá nestes dez dias de “arte” em praça pública? Em que nível estará a convivência e aceitação das crianças, da população, dos estudantes, e dos governantes com a arte pública? Será que há pichações ou vandalismos nos muros, praças, bens públicos e monumentos? E os artistas da cidade? Será que eles têm espaço, reconhecimento, apoio, mercado de arte? Então, vamos imaginar algumas respostas...

Enquanto isso, o tempo passou, mas a Funjope ainda não pôs em prática nenhum projeto que tratasse de Arte Pública (aliás, o melhor conceito de “arte pública” é o da arte colocada em espaços públicos, para desfrute da população) e sua relação com a cidade. Esperava-se que a Edilidade fizesse o lançamento de Editais Públicos para obras de arte nas praças já que, para isso, a Seplan reservou espaço para estas obras nas reformas de dezenas de praças da cidade; uma sessão extraordinária do CDU (Conselho de Desenvolvimento Urbano/ Seplan) para discussão da Lei dos Edifícios que, hoje, infelizmente, não está sendo cumprida à risca e abrindo “brechas” para atender, na maioria, a um sórdido monopólio conduzido por apenas um “arteiro” da cidade; a retomada do Festival de Esculturas de Areia (destinado às crianças de escolas públicas e que já fez sucesso nos anos 1980); e, finalizando, uma proposta de aquisição de uma obra do nosso escultor “contemporâneo” mais importante: Breno de Mattos.

Pois é. Pode ser que a coisa ande e ainda consiga dar respostas para as perguntas do texto-denúncia “Arte e descaso”, de Raul Córdula (publicado na imprensa local): O que se pode fazer para que a população compreenda a importância de certas obras de arte existentes na cidade? Porque, embora alguns dos artistas mais importantes do Brasil sejam artistas modernos e contemporâneos paraibanos, as obras de arte modernas e contemporâneas não são respeitadas na Paraíba?

Esse texto foi divulgado já há algum tempo quando o artista teve várias de suas criações destruídas ou que sofreram interferências, com ênfase para o painel da Assembléia Legislativa, um prédio no centro da cidade, freqüentado por pessoas que, presumivelmente, são educadas, ou mesmo, cultas. Segundo Raul, “A falta de compreensão sobre a obra da Assembléia vai desde a simples aceitação dela como objeto de arte até o uso abusivo de seu tema no próprio ambiente da casa. O tema foi demasiadamente repetido por todo o edifício, adesivado nas portas de blindex, utilizado como logotipo da própria Assembléia e também da TV Povos dos Mares, reproduzida de forma lamentável através de um mural feito de mosaico de caco de azulejos na parede externa do anexo, redesenhado em livros e publicações. Não vejo nenhum problema em se utilizar meu desenho de forma alternativa, mas, ainda que isto seja feito às vezes como forma de homenagear o artista, que se faça com critérios, e com o meu consentimento, pois sou o autor, tenho endereço certo e estou vivo. Isto sugere que as questões que envolvem direito autoral ainda não são conhecidas na Paraíba, pois, na casa do Poder Legislativo, este direito não é aplicado”.