Raul
Córdula tem toda uma produção – pictórica, estética, política, poética,
sensorial, gráfica, visual, plástica, literária etc. – dedicada não apenas aos
olhos do observador e que extrapola muitas questões propostas pelo sistema da
arte tal qual o conhecemos desde há trezentos anos, pelo menos. Raul vai muito
além da ideia comum em situá-lo apenas como esteta ou pintor, como é mais
conhecido. Sem dúvida, essa constatação de multiartista faz de Raul Córdula um
raro espécime em nossas artes visuais.
Aliás,
infelizmente pouca gente sabe desta sua obra tão vária. Por este motivo, ano
passado, ao comemorar seus 50 anos de atuação, Raul optou por apresentar uma
antologia de sua produção na tentativa de abarcar o vasto repertório
desenvolvido ao longo de tantas situações, lugares, movimentos e momentos
cruciais na recente história da arte brasileira. Nesta mostra, 50 Anos de Arte,
exibida no Parque Dona Lindu, em Recife, ele mesmo (com a cocuradoria de Olívia
Mindelo) segmentou em “fases” ou “séries” algumas das suas obras: das aquarelas
produzidas em Paris (1991) às ações em arte postal (O País da Saudade), dos
primeiros desenhos (1965) à atividade multidisciplinar a partir do conto A
Gaivota Cega, das pinturas de teor político (Araguaia e 1968) às geometrias
recentes... E, mesmo com correta montagem, obras seminais de sua lavra, belo
texto da jovem Olívia Mindelo, ação educativa e estupenda visitação (cerca de
50 mil pessoas), a mostra ainda não deu conta de nos apresentar,
verdadeiramente, o múltiplo e raro Raul Córdula.
Agora,
por ocasião da abertura das comemorações dos 10 anos de atuação da Usina
Cultural Energisa, há nova oportunidade de adentrarmos – nós, seus conterrâneos
em especial – no rico universo deste artista. E, mais uma vez por sua decisão
em desvelar outras de suas “fases” e “séries”, Raul escolheu obras destinadas a
também falar de sua paraibanidade, talvez até remetendo à citação atribuída a
Leon Tolstói: “Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia”. Raul
Córdula apresenta algumas obras – até inéditas aqui na “província”, apesar de
produzidas desde os anos 60 – em sincera elegia à sua terra natal, como as
séries Bandeira do EGO, Pedra do Ingá e Borborema. Outras pinturas, geométricas
e recentes, além de objetos, assemblages, vídeos e desenhos compõe essa
antologia do seu fazer artístico. Estas são suas “memórias do olhar” e que,
graças também à sua verve de historiador (e poeta), revela-se primorosa crônica
de seu tempo.