sábado, janeiro 14, 2012

(in)feliz ano novo?

Há 30 anos, na minha adolescência, o carnaval era tempo de sair da cidade em busca de aventuras... Praias de Jacumã, Baía da Traição, Canoa Quebrada e até Olinda e Salvador eram as melhores alternativas para jovens como eu que ainda sonhavam com “sexo, drogas e rock’n’roll” e que não tinham o que fazer em João Pessoa, onde carnaval era sinônimo de mela-mela nos bairros, desfile das pobres agremiações carnavalescas e os bailes dos clubes Astréa (Azul e branco), Cabo Branco (Vermelho e branco), Jangada (Verde e branco) e Iate (Noite do Havaí).

Foi assim, com essa febre de sair da cidade na época do carnaval, que nasceu o Bloco Muriçocas do Miramar e, junto com ele, o projeto Folia de Rua. Daí inventou-se o carnaval do “antes do carnaval”. E, então, todo mundo continuou “fugindo” do carnaval de João Pessoa, embora tivesse lá seu charme poder brincar um carnaval diferente, mais popular, indo “atrás do trio elétrico”, literalmente. Destaque para o fato de que, nessa época, as pessoas daqui (e de Campina Grande, especialmente) costumavam “veranear” (férias de verão) alugando casas na faixa que vai do Mar dos Macacos (hoje, o bairro de Intermares) até Praia Formosa, em Cabedelo. Sempre tínhamos a casa de um amigo pra visitar durante o período de veraneio e nestas visitas e festinhas nasceram muitos “namoros de verão”.

Tempos depois, um famigerado prefeito de João Pessoa inventou de trazer o Axé Music – que explodia no país inteiro – para “alegrar” os jovens (eu, já nem tanto assim) em eventos carnavalescos que tinham o prefixo “mica” (que tem origem na festa francesa, mi-carême, ou seja, que ocorre no meio da quaresma). Espalhou-se no Brasil, a partir de Feira de Santana e de outras cidades nordestinas, esse tipo de carnaval “fora de época”: Micareta, Micarande, Micaroa, Carnatal, Fortal... Isso só fez encher de grana os protagonistas desse tipo de música baiana (há outros baianos, ainda bem) e as empresas de cerveja (então, seus principais patrocinadores).

Outros tempos depois, outro prefeito, muito mais envolvido com os movimentos populares e artísticos, resolve abolir com essa baboseira das “micas”. Não só investiu na música local como também passou a trazer para a cidade nomes de “peso” da boa música brasileira. Ou seja, no verão e no carnaval teríamos, finalmente, motivos para não deixar a cidade. Todos ficamos deslumbrados. Além do nosso bom pré-carnaval – seguindo as Muriçocas, as Virgens de Tambaú e os Cafuçus, especialmente – poderíamos curtir os numerosos festivais de verão: Centro em Cena, Estação Nordeste, Estação do Som, Música do Mundo, Festival Canavial... E tudo já começava no Réveillon.

Não tenho dúvidas de que João Pessoa, entre as capitais nordestinas, é a que apresenta a melhor programação de música no período das férias de verão, em 2012. Somando recursos da Prefeitura e do Estado, foi investido cerca de 1 milhão de reais para pagamento de cachês, passagens, hospedagem e aluguel de palco, luz e som.

No entanto, também há divergências e discrepâncias. Vejamos algumas questões que merecem reflexão de todos (até daqueles que estão abestalhados com tanta coisa boa acontecendo na cidade).

1. Apesar do grande volume de recursos financeiros pros músicos, quem leva a maior fatia são aqueles que vem de “fora”. É uma vergonha o cachê dos grupos e artistas locais que se apresentam nas praças, principalmente;

2. Não incluíram a “prata da casa” – da música – na programação principal (nas areias de Tambaú);

3. Proporcional ao que foi investido (financeiramente também), não incluíram nenhuma “boa” programação em áreas como literatura, dança, teatro, cinema e artes visuais. Vale dizer que uma coisinha aqui e outra ali é apenas querer tampar o sol com uma peneira.

Claro que numa programação cultural de verão, mais voltada para eventos de rua, é complicado organizar atividades afeitas para locais fechados (cinema, teatro, dança e artes visuais, em especial). No entanto, falta mesmo é “cabeça pensante” no poder oficial que “crie” projetos nestas outras áreas da cultura. Por exemplo, com o mesmo investimento de trazer um Frejat ou um Antonio Nóbrega, poderíamos convidar um grande grupo de dança (ou de teatro) para várias apresentações gratuitas. Ou organizar exibições de cinema ao ar livre. Ou levar a Orquestra Sinfônica para a praia...

Na área de artes visuais também há muitas opções. Parece até que nossos dirigentes nunca ouviram falar de Street Art, de ações de arte pública com artistas realizando intervenções urbanas, mutirões de grafite, esculturas efêmeras ao ar livre, oficinas de artes para crianças (afinal, estamos de férias), concurso de escultura de areia, mostras em placas de outdoor espalhadas pela cidade... Pelo visto, aqui não falta dinheiro pra música no verão, apesar de faltar dinheiro o ano inteiro para outras categorias artísticas, inclusive para o nosso bom pré-carnaval.

Vou ficando por aqui. Daqui a pouco vou buscar minha filha que está se divertindo com as amiguinhas na Praia de Tambaú (muito diferente de Luiza, que está no Canadá, infelizmente).