sábado, dezembro 31, 2011

infeliz ano velho

Como acontece a cada final de ano, as pessoas geralmente fazem uma “retrospectiva” de sua vida pessoal e daquilo que ocorreu noutras searas – cultura, política, economia etc. – e que, óbvio, também diz respeito à sua vida. No entanto, fazer um balanço do que aconteceu em apenas um ano serve mais para ensaiar um jogo de memória (lembrar pessoas, datas e acontecimentos, por exemplo) do que para refletir judiciosamente sobre cada momento vivido.

Como em toda e qualquer análise essa “retrospectiva” terá a cara daquele que a realizou, com seus pontos de vista, versões e/ou opiniões próprias. E é este o caso. Pode haver discordâncias ou concordâncias, dependendo do lado que o leitor esteja.

Nas artes plásticas (minha principal área de atuação), posso dizer que tivemos um ano pífio (aqui em João Pessoa, Paraíba, especialmente), apesar dos pesares. Vejamos:

No âmbito federal, o Ministério da Cultura ainda não disse a que veio. O ano começou com polêmicas no planejamento do evento Europália (previsto para acontecer na Bélgica, em outubro) e com atrasos (além da falta de informações) na análise de dezenas de editais, ambos, assuntos “criados” ainda na era Juca Ferreira (no MinC), portanto, problemas oriundos de outro “governo” (a segunda gestão de Lula). A nova ministra, Ana Buarque de Hollanda, ainda hoje bastante questionada por diversos setores da sociedade civil, iniciou seu mandato retirando a logomarca do Creative Commons do portal do MinC, o que provocou acalorada discussão sobre direito autoral na área artística. Apenas no finalzinho do ano é que surgiram boas notícias: retomada da discussão em torno dos editais atrasados; lançamento de novos editais e das metas do Plano Nacional de Cultura, esta, certamente, a mais importante ação do governo federal na área da cultura. São metas e linhas de ação que servirão de orientação aos estados e municípios brasileiros.

Já, em nível estadual e municipal, as artes plásticas andaram para trás. No estado, nada se fez em prol de ações de formação (de platéia e de artistas), de produção e de circulação. Nada. Lamentável que estamos falando do governo de Ricardo Coutinho que, anos atrás, foi o principal articulador da lei de incentivo à cultura (a Lei Viva Cultura, do município de João Pessoa). Neste ano foi extinto o Conselho Estadual de Cultura (por serem membros "indicados" pelo poder oficial, nem tinha lá tanta importância, mas foi "riscado" do mapa) e pago, finalmente, o restante das parcelas do Fundo de Incentivo à Cultura Augusto dos Anjos (lançado ainda no governo Cássio). Só. Também, devo registrar que o Festival Nacional de Arte foi cancelado (por que parou? parou por que?) e nada foi feito de concreto para a instalação do Museu de Arte Contemporânea da Paraíba.

No município de João Pessoa a coisa foi bem pior (se é que pode ser assim tão ruim). Apesar da manutenção das ações do Fundo Municipal de Cultura e do edital para oficinas de artes (formação e capacitação) em várias localidades da periferia da cidade, nada foi acrescentado que pudesse estar à altura da nossa produção em artes visuais. O Salão Municipal de Artes Plásticas [Samap], que mesmo executado totalmente com verba da Funarte (edital Festivais de Fotografia, Performances e Salões Regionais, na categoria Artes Visuais 2010), ainda não produziu seu catálogo como também não honrou, satisfatoriamente, outros compromissos: do não pagamento de cachê a um dos membros da comissão de seleção e premiação até o atraso, injustificado, do repasse de prêmios e pro labore a alguns dos artistas selecionados e o adiamento, por diversas vezes, da realização da mostra da artista, Danielle Travassos, detentora do prêmio de artista revelação do referido Salão. Somente após ampla divulgação nas redes sociais, a Funjope agendou para dezembro a mostra de Danielle na Estação Cabo Branco.

Lamentável é confirmar, mais uma vez, que quase toda a verba (mesmo pouca, diga-se) destinada à cultura pelos governos – do Estado da Paraíba e da Prefeitura de João Pessoa – foi dedicada às ações na área de música e de cultura popular. Para atestar essa informação basta acessar os portais dos órgãos culturais que, graças à Lei Capiberibe (Lei Complementar Federal nº 131/2009, que obriga os poderes nas esferas municipais, estaduais e federal a publicar, em tempo real, na internet, suas receitas e seus gastos), é possível saber, exatamente, os recursos investidos na área cultural.

Nada contra o apoio oficial à cultura popular e à “boa” música, mas não se justifica o “quase nenhum” investimento em artes visuais, literatura, dança etc. De quem é a culpa? Dos mandatários do poder? Dos artistas? Será que precisaremos fazer algum lobby para termos um artista plástico (ou escritor ou poeta ou cineasta, por exemplo) como secretário de cultura? Em tempo: o curto período da gestão do artista plástico, Flávio Tavares, na ainda Subsecretaria de Cultura não foi bastante para fazermos melhor avaliação. Aliás, deveríamos tomar como exemplo a atuação de Gilberto Gil no Ministério da Cultura que, mesmo sendo da área musical, investiu fundamentalmente em todas as tendências, matizes, raízes, etnias e categorias da cultura.

Há expectativas para o(s) próximo(s) ano(s). Somos otimistas, claro. Apesar de tudo, esperamos que os governos ainda nos apresente um programa de fomento às artes através de investimentos na circulação e formação (de platéia, de técnicos e de artistas), na consolidação de mercado (financiamento em condições de competitividade, economia criativa) e na implementação de políticas públicas (inclusão social, patrimônio cultural, editais públicos etc.).

Para finalizar, destaque para dois eventos que merecem aplausos: a exposição iconográfica sobre José Simeão Leal (Usina Cultural Energisa, entre junho e julho) e a mostra, Divortium aquarum, de José Rufino (Usina Cultural Energisa, entre setembro e novembro, inaugurando o Prêmio Energisa de Artes Visuais). Dois artistas e personalidades – por acaso, primos, embora de gerações distintas – que são unanimidade na cultura nacional (isso é coisa rara) e orgulham nossa pobre Paraíba. Sem mais palavras.