quinta-feira, fevereiro 24, 2011

um museu para a arte paraibana*

* texto do jornalista, Elinaldo Rodrigues, publicado no jornal O Norte, em 21 de setembro de 1999

Em fax enviado recentemente a este jornal, o artista plástico Dyógenes Chaves contestou a possível “polêmica” anunciada em nota assinada por este repórter, quanto à criação do Museu de Arte Contemporânea em João Pessoa. Dyógenes explica que o projeto é da Funesc e foi enviado para o Ministério da Cultura em 1997. Na época ele foi preparado por Raul Córdula e Dyógenes, diretor do DDAC e coordenador de Artes Plásticas da Funesc, e Amélia Couto, técnica em museologia da Fundação Joaquim Nabuco. Recentemente, ele foi retomado pelo próprio Raul Córdula a convite da presidência da Funesc. Para Dyógenes, não há polêmica à vista, mas sim “erro de interpretação” em torno da palavra contemporâneo, que nem sempre significa vanguarda, portanto, podendo abrigar tanto instalações e obras modernas como os clássicos.

“Quando pensamos em criar um museu de arte em João Pessoa foi no intuito de assegurar um espaço para abrigar a ‘boa’ produção paraibana e também, para promover mostras de alto nível e que não chegam aqui por falta de um espaço museológico adequado. Portanto, jamais será um espaço para apenas essa ou aquela tendência artística. Quanto ao nome, podemos escolher qualquer denominação ‘técnica’ para o museu. Tanto faz. Somente achamos que devemos optar por um nome atual. sonoro, normal”, diz.

Ele salienta ainda que a “coleção que vai dar início ao acervo deste Museu será justamente formada de artistas ‘modernos’ (e alguns ‘clássicos’) como os paraibanos Flávio Tavares, Miguel dos Santos, Roberto Lúcio, Raul Córdula, Chico Dantas, Ivan Freitas, Maria Helena Magalhães, além dos primitivos Francisco Araújo e Ana Pamplona”, bem como vários outros artistas que também tem obras na pinacoteca da Funesc.

“O problema, parece, é que não se pode pensar em coisas grandes e importantes nesta cidade. Vem logo um reclamar. Talvez apenas por imaginar que será logo alijado do projeto. Nem pára pra pensar que qualquer que seja a ‘cara’ deste museu será a ‘cara’ da arte, daí, da liberdade de pensar e se exprimir ou nos benefícios de uma obra desta magnitude”.

Embora elaborado há dois anos, em torno da proposta de criação do Museu de João Pessoa não houve uma real interação com a comunidade artística local. Isso talvez explique um aspecto da polêmica que de fato existe sobre o assunto e as reclamações que surgiram tem suas justificativas. Nomes como Gabriel Bechara, Chico Ferreira, Hermano José, por exemplo, apontam para o fato de que até então as grandes obras produzidas no Estado sequer ganharam um espaço adequado para resguardá-Ias, muitas das quais encontram-se em estado de degradação em ambientes inadequados das instituições públicas. Há vários anos Hermano José tenta doar seu acervo, composto por obras de grandes artistas paraibanos, contudo até hoje as instituições públicas ligadas ao setor, não demonstraram interesse. Hermano, que também foi um dos responsáveis pela criação da Pinacoteca da Universidade Federal da Paraíba, lamenta que para este projeto de criação do Museu não seja realizado um debate entre os artistas para discutir o assunto.

Ao contrário do que acredita Dyógenes Chaves, a polêmica de fato existe, e é antiga, testemunhada por pessoas que almejam a preservação e dinamização das artes no Estado, como também dos que querem priorizar um segmento mais adequado ao termo contemporâneo. Quanto à nomenclatura “contemporâneo”, ela de fato remete a ideia de limitação, o que não decorre com instituições como o Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro, o Museu Metropolitano de Nova York, o Museu do Louvre, em Paris, nos quais há várias subdivisões para abrigar os diversos segmentos e tendências artísticas. Além disso, como atesta Gabriel Bechara, “um museu já pressupõe uma coisa arquivada, e a arte contemporânea está em processo”, referindo-se ao fato de que um dia ela vai deixar de ser contemporânea.

Gabriel acrescentou que “ainda não é o tempo de se criar algo desse tipo na Paraíba. Afinal, João Pessoa já dispõe de um Núcleo de Arte Contemporânea e de um Museu de Arte Sacra e Popular (Convento de São Francisco), ambos de cunho restrito, mas não existe um museu de arte no Estado onde a arte paraibana possa ser vista em sua plenitude.”

A preocupação é que ao não considerar a opinião da comunidade artística num projeto de natureza pública se crie ambientes como o Espaço Cultural da Paraíba, que embora com uma estrutura grandiosa, funciona hoje precariamente. Ainda sob os auspícios da ditadura militar o empreendimento simplesmente foi implantado sem se levar em consideração as aspirações do meio artístico local, sobre como deveria funcionar um equipamento desse porte. Caso contrário o seu funcionamento poderia ter tomado um rumo mais dinâmico, acompanhando a efervescência da produção cultural paraibana.

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