sábado, março 22, 2008

mercado de arte ou comércio de obras?*

* texto publicado no jornal O Norte, em 02 de março de 2008

Outro dia um coroado artista paraibano me falou algo que me fez parar para pensar. Disse ele: “O mercado imobiliário de João Pessoa entrega cinco novos apartamentos a cada dia, mas, infelizmente, nas suas paredes não tem uma só obra de arte.” Ora, pode até se discutir a veracidade desta frase, no entanto, desconheço que se vendam cinco obras de arte a cada dia em nossa cidade. Como só conheço, embora não muito, a realidade das nossas artes visuais, posso garantir que não há, de fato, um mercado de arte na cidade que “sustente” tantos artistas plásticos. A grande maioria destes tem um subemprego em alguma repartição pública ou é professor universitário. Poucos, pouquíssimos, conseguem viver apenas da venda de sua produção.

Claro, sempre se soube que o artista não é o melhor anunciante ou vendedor de sua própria obra. Como também que todo crítico é um artista frustrado. Ou, que toda unanimidade é burra. Há exceções, ainda bem. Embora a realidade de penúria do mercado de arte da Paraíba não seja diferente da de outros Estados, e mesmo sendo este um dos mais pobres estados da Federação, temos uma vigorosa produção nas artes visuais (vide a obra de Raul Córdula, Antonio Dias, Alberto Lacet, Tomás Santa Rosa, Pedro Américo, Alexandre Filho, Ivan Freitas, José Rufino, entre tantos) que, tranquilamente, poderia garantir-lhe lugar de destaque entre outros até mais desenvolvidos e ricos. Disso, pouca gente discorda.

Mas, o que há então que se reclama tanto pela falta de um mercado de arte na cidade? Ora, um certo número de bons artistas e muitas paredes já temos. Repito: o que falta? Só para ilustrar, vi outro dia, num programa de televisão, o escritor Bráulio Tavares dizer uma pérola sobre a maior riqueza – a cultura – da nossa terra Tabajara: “Quando eu chego em certos lugares e digo que sou da Paraíba, logo as pessoas se apressam em citar os nomes – a mancheias – de nossos principais artistas, que são de todas as áreas, todos os matizes, e fundamentais para a compreensão da cultura brasileira.” Se somos assim tão valorizados e aplaudidos, por que não conseguimos vender nosso trabalho?

A cada dia, como numa linha de montagem na produção industrial, surgem novos artistas. Às vezes, “fabricados” pela imprensa que pouco se importa em saber a diferença entre artistas e aspirantes a artistas. Outras vezes, confundidos com pessoas que buscam na pintura, especialmente, uma terapia para passar o tempo ou curar o tédio. Daí, sair na imprensa, é um “pulo” para se achar o tal artista. Somos amadores, essa é verdade (aliás, toda a cadeia produtiva é amadora).

Há muitas evidências para se chegar à conclusão do porque os artistas são “pobres” ou não profissionais e daí, por que não temos um mercado de arte. Vamos lá. Primeiro, nunca existiu mesmo um comércio de obras de arte antes dos anos 1970. Os artistas, geralmente, presenteavam a família e os amigos. Também, nunca ouvi falar que houvesse, regularmente, Leilões de obras de arte na cidade desde este período. Claro, a não ser àqueles, um ou dois, que ocorreram no Clube Astréa, final da década de 70 e inicio de 80, época que a cidade tinha bem mais apreciadores (e colecionadores) de arte do que artistas. Um Leilão demonstra a “briga” por adquirir uma obra, às vezes, por um preço muito acima do mercado.

Depois, a maneira mais fácil de adquirir obras de arte nos anos 1980 era através de Consórcio, ou seja, um grupo de pessoas pagava uma cota mensalmente e, alguém do grupo era sorteado para escolher e receber sua obra. Se por um lado este método era muito eficaz (artista-colecionador), por outro refletia a nossa pobreza de mercado de arte. Todos sabem que o consórcio está associado a uma camada da população que não possui condições de comprar um bem à vista. Mas, o que importa é que nunca se vendeu tanto como nessa época. Outra evidência é a comercialização de obras de arte produzidas aqui mesmo, pelos artistas locais. É muito raro saber de colecionadores da cidade que possuem obras de artistas brasileiros, de outros estados, adquiridas em galerias da cidade. A província só compra na província como numa feira de trocas.

As poucas (e heróicas) galerias de arte deram lugar aos arquitetos e decoradores como intermediários entre os artistas (as obras) e o colecionador-comprador. A grande maioria das obras vendidas são indicações destes profissionais que, não só se responsabilizam pelos móveis e acessórios decorativos, mas também pelas obras de arte que vão compor o interior dos novos apartamentos, mansões e prédios institucionais.

Como antigamente, os artistas continuam dependendo do Estado (já foi a Igreja e a Realeza, noutros tempos) para sobreviver, seja através de contratos para vender grandes painéis e esculturas públicas até dos apoios advindos de leis de incentivo à cultura. E neste caso, a Prefeitura de João Pessoa e o Governo do Estado possuem suas leis de incentivo (FMC e FIC), que tem funcionado muito bem. Ainda bem.

Diante de tudo isso, para mim, só há uma saída: os artistas partirem para um marketing mais “agressivo” propondo novos consórcios (já que funcionou noutras épocas), ou se associando a outros artistas, ou buscando aproximação com os arquitetos para dar visibilidade à sua produção, ou, ainda, “achando” a figura extinta do marchand (só que desta vez do “personal marchand”) que promoveria a venda desta produção. Mas, não é fácil nada disso. E, diante do marasmo que existe, parece que o jeito mesmo é arranjar um emprego ou esperar pelas Leis oficiais e a generosidade do poder público.

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