domingo, maio 01, 2011

dar a césar o que é de césar

Foi instalada uma “boa” polêmica nas redes sociais e principais veículos de notícias – locais e nacionais – comentando sobre recentes declarações do secretário de cultura da Paraíba, Chico César, que disse (ou não disse?) que não contrataria bandas de “forró de plástico” para as festividades oficiais: “Nunca nos passou pela cabeça proibir ou sugerir a proibição de quaisquer tendências. Quem quiser tê-los que os pague, apenas isso. São muitas as distorções, admitamos. Não faz muito tempo vaiaram Sivuca em festa junina paga com dinheiro público aqui na Paraíba porque ele, já velhinho, tocava sanfona em vez de teclado e não tinha moças seminuas dançando em seu palco. Vaias também recebeu Geraldo Azevedo porque ele cantava Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro em festa junina financiada pelo governo aqui na Paraíba, enquanto o público, esperando a dupla sertaneja, gritava ‘Zezé cadê você? Eu vim aqui só pra te ver’.”

O jornalista, Henrique França, em oportuno artigo sobre o assunto diz que “Chico César foi vítima e vilão, ganhou mais respeito por alguns e insultos por outros. E, pasmem, ganhou um bom número de internautas que declararam sequer conhecer esse ‘tal Chico César’! Os argumentos contrários à declaração do cantor se baseiam na vontade popular: se o povo gosta, dê a ele todo lixo em forma de canção, dancinhas e gritinhos.”

Ora, claro que as pessoas de bom senso concordam que alguns dos argumentos contrários ao dublê de artista e secretário são frágeis e não se sustentam. Também concordam que qualquer forma de arte – música, teatro, cinema, artes plásticas etc. – é sim um instrumento de mudança social, e que o governo é de todos, independente de opção política, de classe social, de etnia, de gênero etc.

No entanto, proliferam pelo país programações equivocadas de gestões oficiais de “eventos” espalhando atividades que apenas se preocupam em preencher gráficos, estatísticas e relatórios para prestação de contas. São “micarandes, micaroas e micaretas”, festivais e shows oportunistas que só servem para entupir jovens de cerveja e suor, ou o bolso de empresários inescrupulosos sem nenhuma formação (principalmente, cultural). Outras drogas – como a péssima música, essa mesma abordada por Chico César, por exemplo – também estão nesse saco de gatos. O pior é atestar que muitos empresários, governos e dirigentes culturais emprestam total apoio a esta falsa ação cultural. E isso acontece pela falta de uma programação cultural calcada em uma política que trate a “cultura como direito e condição de cidadania, como dimensão simbólica e, principalmente, como política estratégica de Estado”, como disse o ex-ministro da cultura, Gilberto Gil.

Em que lugar está o cerne do problema?

Primeiro, na falta de quadros (nos governos) capazes de enxergar a cultura de uma maneira ampla, em todos os seus matizes, raízes, tendências e categorias. Poucos dirigentes culturais têm formação técnica ou conhecimento de causa para discernir uma “instalação” de artes plásticas de um cenário de teatro; uma “assemblage” de uma escultura. No geral, são pessoas que tem conhecimento apenas superficial (ou nenhum) sobre teatro ou música ou artes plásticas ou literatura... E sua escolha para dirigir os órgãos culturais oficiais sempre reflete o também pouco conhecimento no assunto dos governadores e prefeitos. Aliás, para estes, quando cultura será política estratégica de Estado, de fato e de direito?

Mas, voltando à citada polêmica do início deste texto, quero abordar algumas “quase” contradições... Ora, se há música “ruim”, com seus versos que fazem apologia ao sexo ou ao desrespeito às mulheres, por exemplo, será que também não há cinema ou artes plásticas “ruins”?

Em que pese não haver as mesmas comparações com a polêmica (música “ruim” versus música “boa”), parece que não há a mesma disposição do Estado (Prefeitura e Governo do Estado) em apoiar (ou discernir) a “boa” artes plásticas. Vejamos: é ínfimo o número de projetos de artes plásticas aprovados nas leis de incentivo à cultura (música e teatro sempre levam a maior parcela dos recursos); o último SAMAP (Funjope) foi patrocinado por um edital da Funarte/MinC, e mesmo assim ainda não finalizou o catálogo e outras ações previstas no projeto; o último (e controverso) edital público para instalar esculturas em praças e espaços públicos foi realizado em 2009; a Lei dos Edifícios precisa ser discutida seriamente (que tal uma reunião do Conselho de Desenvolvimento Urbano para tratar dessa questão?) e sustar a instalação de “monstrengos” de alguns artistas-lobistas em prédios particulares e públicos; não existe um atuante Fórum Permanente de Artes Visuais (como existe na dança, por exemplo); os atuais coordenadores oficiais (Prefeitura e Governo do Estado) da área de artes visuais são despreparados e inexperientes (e isso é meio caminho para não acontecer “boa” política pública); não há ainda uma clara programação para capacitação e formação (de platéia e de artistas); com exceção do edital de ocupação da Galeria Archidy Picado/Funesc (iniciativa de gestões anteriores, diga-se), é discutível a qualidade das mostras oficiais; e, tudo está parado quanto aos novos espaços de exibição: Museu de Arte Contemporânea da Paraíba, Museu de Campina Grande...

Já nos eventos culturais (e de entretenimento) promovidos pelos órgãos oficiais só há lugar para teatro e música. Ou seja, nossos colegas artistas da boa música e do bom teatro têm emprego durante o ano todo (e todo ano). É festa da padroeira, juninas, carnaval, semana santa e revéillon, afora as programações das novas praças, os festivais de música e outros eventos sazonais. Ótimo. Não acho isso ruim (até porque amo minha terra, sua gente, seus artistas e suas festas populares). Mas, nestes eventos não há lugar para artistas plásticos (eu, pessoalmente, nem acho que se encaixam bem em qualquer evento de rua). Daí, solicito ao secretário de cultura, Chico César, que use a mesma sentença “nunca nos passou pela cabeça proibir ou sugerir a proibição de quaisquer tendências” e nos apresente uma política cultural para as artes plásticas, "boa" ou "ruim".

Nenhum comentário: